A Revolução que o Mercado não quer

Durante as duas últimas décadas o equilíbrio de poder entre a política e o comércio mudou radicalmente, deixando os políticos cada vez mais subordinados ao colossal poder econômico do grande negócio, ao Mercado. Desde o seu desencadeamento pela dupla Thatcher-Reagan, este processo cresceu nas últimas duas décadas quase sem nenhuma oposição ou contestamento da sociedade civil.

Os meios tradicionais de comunicação, sendo parte do Mercado e dele dependente, renderam-se ao consenso e calaram vozes dissidentes nas matrizes e nas periferias do grande capital. Nos protestos populares contra a globalização e o G-7, foram infiltrados agentes provocadores e tudo que foi passado na TV e estampado nos jornais e revistas foram a baderna e o quebra-quebra, a grande imprensa desmoralizou a resistência à globalização e ao Mercado como simples arruaças de baderneiros anarquistas.

Nas periferias do grande capital a imprensa tradicional demoniza os poucos governos verdadeiramente populares como opositores da democracia ocidental (consenso do Mercado), loucos, megalomaníacos e populistas ditadores comunistas. A supressão de politicas de inclusão social e de qualquer questionamento ao consenso do Mercado é impiedosamente atacada e ao mesmo tempo vendida pela grande imprensa aos incautos e desinformados como agressão a democracia e ao progresso.

Independentemente da forma como enfrentamos ou olhamos para este processo de dominação que estamos vivendo, as empresas estão assumindo cada vez mais as responsabilidades de governo, e estão de fato definindo a esfera pública. O Estado político tornou-se o estado corporativo.

Governos, por não reconhecer o risco da aquisição do estado pelas grandes corporações, estão quebrando o contrato implícito entre o Estado e o cidadão, contrato que está no cerne de uma sociedade democrática, fazendo com que a rejeição das urnas e aos partidos políticos, o abraçar de formas não tradicionais de expressão política uma idéia cada vez mais atraente senão única no enfrentamento deste consenso imposto pelo Mercado.

Hoje, graças à internet o mundo está sintonizado com o mundo, e percebe-se que em quase todos os países do globo existe preocupações que estão sendo levantadas sobre as “lealdades às corporações” e os reais objetivos dos governos e governantes. Existe uma preocupação crescente de que o pêndulo do capitalismo pode ter oscilado um pouco longe demais, e que o nosso “caso de amor” com o mercado livre pode ter obscurecido duras verdades, de que muitos, milhões estão a perder neste mundo governo pelo Mercado e sendo condenados diariamente a miséria absoluta e sem nenhuma perspectiva de avanço sócio-económico.

Após as crises brasileiras do período FHC, da crise da sub-prime nos Estados Unidos e agora com o colapso do PIG (Portugal, Irlanda e Grécia) e a crescente crise européia, podemos perceber que não se pode confiar no Estado e políticos para cuidar de nossos interesses de cidadão, e que estamos pagando um preço demasiadamente alto para o aumento deste nosso crescimento econômico A realidade é que neste mundo globalizado a real competição entre nações significa apenas quem pode auferir maior lucro ao, realmente globalizado, Mercado, o dono de tudo e de todos.

Existe um paradoxo fundamental no coração dos governos seguidores do modelo de Milton Friedman e Friedrich Hayek, que ao reduzir o Estado ao seu mínimo, colocando as empresas no centro do palco, riscam a sua própria legitimidade e acabam por destruir séculos de conquistas econômicas e sociais, mandando-as para o ralo do esgoto do “Livre Mercado” como testemunhamos nos casos das privatizações dos serviços públicos nas matrizes e na periferia do grande capital.

Aos poucos e em parte graças a estes excessos que não encontram barreiras, e agora expostos pela crise do capitalismo global, parece acordar lentamente a sociedade, agora preocupada que o som dos negócios está abafando as vozes do povo. A ira e movimentação popular contra a tirania na Primavera Árabe mostrou o uso benéfico da tecnologia como uma ferramenta eficaz para aglutinar e organizar vozes discordantes, e o uso das redes sociais e blogs na Internet são uma demonstração clara do poder de reação da sociedade contra a campanha de pasteurização das massas posta em curso pelo consenso do Mercado.

Esta reação ao Mercado é um processo incipiente mas de cunho global, e no Brasil os seus facilitadores principais são os chamados Blogueiros Sujos ou Progressistas que quase que sem querer ou perceber estão criando uma nova conscientização nas massas pensantes, ingenuamente mostrando que podemos ter movimentos democráticos de alternativa ao poder fora das tirania das cúpulas ou do comando de caciques de partidos políticos.

Estes blogs estão oferecendo palanque a milhões de vozes e idéias neste processo ajudando a sociedade a fiscalizar melhor, a combater políticos e politicas contrarias ao interesse popular e nacional, a desconstruir mentiras vendidas como santa verdade pela grande imprensa, e o mais importante colocando pessoas a pensar, a ouvir e a expor opiniões, começamos finalmente a debater, a nos informar sobre o mundo real. A grande imprensa já não tem o controle total da informação e esta é a primeira vitoria de uma longa guerra.

A nova constituição da Islândia, que está sendo discutida através de consultas populares via o Facebook e de outras plataformas sociais, está mostrando o caminho a ser seguido pelas sociedades mundo afora, e esta participação verdadeiramente popular é o que menos interessa ao Mercado e seus agentes nacionais, ao status quo do mundo politico.

Hoje os partidos políticos tradicionais, comprometidos que são com o Mercado e a santa governabilidade, são apenas uma distração, uma forma de divisão das massas, enquanto discutimos Friedman, Keynes e Marx, o Mercado conta o seu lucro e os políticos assaltam e se apoderam cada vez mais do Estado.

A internet que foi em parte concebida para a guerra e vista pelo Mercado como uma nova e poderosa arma de colonização do Império e seus satélites, uma espécie de Coca-Cola do século 21, transformou-se por uma ironia sutil em uma arma poderosa, senão única dos revolucionários do novo século, finalmente poderemos aposentar as Kalashnikovs pela Wide World Web.

A luta não é ou será fácil ou de vitória rápida, como estamos testemunhando com os casos da Banda Larga Popular/PNBL, da Ley dos Médios e do AI-5 digital do Senador Azeredo, mas mesmo com todo o poder de manipulação do Mercado e seus agentes ninguém poderá conter esta revolução porque ela é verdadeiramente de cunho democrático, popular, humano e inclusivo.

– No mundo atual as trezentas maiores empresas multinacionais representam mais de 25 por cento dos ativos mundiais. Os valores anuais de vendas de cada uma das seis maiores corporações multinacionais são ultrapassados tão-somente pelo PIB de 21 países –

Carlos Mundim

Deixe um comentário

Arquivado em Idéias

Deixe um comentário